1. O início do Processo
Data de 22/11/1991 a declaração escrita dos nossos conterrâneos Adélio Reis Pedreiras e mulher, Cacilda de Oliveira Reis, a autorizarem o loteamento dum seu terreno no Cabeço “que doaram à Junta de Freguesia de Bustos para implantação de um Bairro Económico”.
A formalização dessa doação veio a ocorrer por escritura de 19/2/1993, era Presidente da Junta de Freguesia o dinâmico Narciso Paiva Cardoso, então eleito pelas listas do CDS, partido de que veio a divorciar-se ainda durante o seu mandato. O Secretário e Tesoureiro da Junta eram, respectivamente, Miguel Henriques de Sousa Barbosa e Mário Fernando Pereira Grangeia.
O terreno teria cerca de 3.260m2 e a Junta, desejosa de dispor duma área mais generosa, logo diligenciou a aquisição de outro terreno confinante, pertencente a Aníbal dos Santos Tribuna e mulher, Benilde da Silva Aires (1/2) e a Manuel da Costa Pinto e mulher, Vitália dos Santos Tribuna (1/2). Por escritura de 30/12/1992 o Aníbal vende a sua metade à Câmara, enquanto o Manuel Pinto transmite a outra para a Junta. Vá-se lá saber o porquê desta venda a diferentes donos, visto ter ficado bem expresso nessa escritura pública o óbvio destino do terreno: “implantação nele de habitação social da freguesia de Bustos”.
Só por escritura de 23/4/1997, lavrada no Cartório Privativo da Câmara, esta lá acabou por doar à Junta a ½ que lhe fora vendida pelo Aníbal e mulher.
Curiosamente, ainda em 1993 o nosso executivo local reduziu a escrito particular uma troca entre José de Jesus Parreças e a própria Junta, segundo a qual aquele cederia a sua casa e quintal no Corgo (ao lado da igreja) e receberia da Junta o lote n.º 3 do Bairro Económico. Bem visto, atento o desenquadramento paisagístico daquela construção.
Mas a iniciativa da Junta de então levou a que outros bustuenses também tivessem vendido terrenos à Junta, sempre para o mesmo fim: foram os casos do Aníbal Francisco Pedreiras e mulher, Rosa dos Santos Marco e do Rogério de Almeida Novo e mulher, Maria Ester dos Santos Alfeza, nestes casos sem escrituras que vislumbrasse.
Ao todo e contas feitas, são mais de 8.800m2 à espera de condições administrativas para começar a obra.
Ao todo e contas feitas, são mais de 8.800m2 à espera de condições administrativas para começar a obra.
2. O projecto de Loteamento do Bairro
Entre Dezembro de 93 e igual mês de 97 foi Presidente da nossa Junta Albertino Alves Marques, médico, eleito pela última maioria PSD.
Na posse do imprescindível espaço físico, oferecido ou vendido, também ele não se poupou a esforços. Ainda antes de terminar o seu mandato (vivia-se então um tempo de vacas magras, que ainda não chegara a hora da árvore das “patacas comunitárias”), dirige em 17/6/97 um ofício à Câmara, no qual, após frisar a atrás citada doação camarária de 23/4/97, “mais uma vez” solicita ao Dr. Acílio Gala “…autorização de realizar um loteamento dos terrenos, para que assim possamos todos avançar com o projecto de construção de casas de cariz social ”.
Entretanto, as inscrições de candidatos a habitação própria já se vinham acumulando e do dossier constam até fichas de inscrição, datadas de 1997. As pobrezinhas ali continuam à espera de melhores dias… Foram 17 as famílias inscritas, se não me falhou a contabilidade.
A resposta àquele ofício não demorou: em Agosto de 1997, a Arq.ª Fernanda Seixas dava por concluído o projecto do Bairro Económico, o qual contém, além da divisão do terreno global em 17 lotes (estes com uma área total de 4.596m2), todos os projectos de arquitectura das habitações unifamiliares. Isto é, os lotes já eram adquiridos com as plantas de arquitectura das habitações, pelo que os interessados apenas teriam de mandar elaborar os projectos das chamadas especialidades (águas, saneamento, electricidade, etc.).
Mal estes dois voluntariosos presidentes de Junta sabiam que a noite negra do Bairro Económico do Cabeço ainda estava para vir. E para ficar, ficar...
3. Quinze anos de promessas escritas
3.1. O Bairro Económico nos programas eleitorais
No seu Programa de Trabalhos de 1989 (as eleições foram a 17 de Dezembro) o então noviço Acílio Gala já falava na "Aquisição de terrenos e loteamento destes, para construções sociais nas Freguesias mais carenciadas".
As prioridades foram outras, mas no seu Programa de Trabalhos de 1993 (eleições a 12 de Dezembro), lá estava, copiada a papel químico, a promessa da mesma vontade de "Aquisição de terrenos...", blá, blá, blá.
No manifesto de 1997 do CDS de Bustos (eleições a 14 de Dezembro), encabeçado pela 1ª vez por Manuel da Conceição Pereira, o bairro do Cabeço era uma aspiração a concretizar.
O mesmo propósito foi renovado em 2001. Em 2005, o ainda Presidente da Junta vai mais longe e fala em "Iniciar o projecto de construção das unidades habitacionais no Bairro Económico".
Pelo lado do PS:
- No programa de 1993 dos candidatos do PS por Bustos constava, em concreto, a "Construção do Bairro Económico do Cabeço". A lista era encabeçada pelo António Augusto Almeida (Tó), que bem merecia outro acolhimento. Mas a disputa partidária haveria de continuar entre os aguerridos CDS e PSD, numa guerra com contornos fratricidas.
- Em 1997, o programa do candidato do PS à Câmara Municipal (Rui Barqueiro) insistia na "...construção do bairro social do Cabeço, já projectado há vários anos."
- Em 2001, assumi a candidatura por Bustos. O primeiro dos objectivos propostos foi o "Arranque imediato do projecto de construção do Bairro Económico do Cabeço."
- Em 2005, o Umberto Reis Pedreiras (Xico) dá também a primazia à construção do bairro.
Pelo lado do PSD não encontrei uma palavra, embora me faltem alguns manifestos e programas eleitorais.
3.2. O que se fez no meio de tantas promessas
O CDS mandou na Câmara entre 1989 e 2005. E manda em Bustos, de forma ininterrupta, desde 1997.
Dinheiro foi coisa que não faltou, tantos foram os milhões vindos da Europa comunitária. Muito menos entendimento entre os 2 governantes, visto que ambos leram e lêem pela mesma cartilha partidária.
Dinheiro foi coisa que não faltou, tantos foram os milhões vindos da Europa comunitária. Muito menos entendimento entre os 2 governantes, visto que ambos leram e lêem pela mesma cartilha partidária.
Mas há duas coisas que faltaram ao poder destes césares:
- Que o terreno principal tivesse sido cedido por um CDS local;
- Que a sua aquisição tivesse custado aos cofres públicos uns largos milhares.
Este poder gosta dos seus, privilegia-os. E gosta de pagar, às vezes a peso de ouro. A bem da economia de mercado e da livre circulação da moeda.
Para este poder, seja local seja nacional, a solidariedade social é um mal necessário e a intervenção do Estado e das Autarquias deve reduzir-se ao mínimo dos mínimos.
O que explica a aversão dos executivos Gala em investir na área social. Guardo montes de dossiers sobre esse menosprezar contínuo, por sinal minimizado no último mandato.
Mas vamos aos factos:
Nascido em 1991 da generosidade dum nosso conterrâneo, cujo grande azar foi ter nascido e crescido antifascista e, no pós 25 de Abril, se assumir como socialista, o projecto do Bairro conheceu algumas noites de esperança; dias, que se saiba, não conheceu nenhum.
Afinal e decorridos os avanços iniciais de Narciso Cardoso e Albertino Marques, o que fizeram a Câmara e a nossa Junta pelo Bairro Económico do Cabeço, entre 1998 e 2005?
Parece que por alturas da campanha eleitoral de Dezembro de 2001 a Junta esboçou uma terraplanagem no local, como quem diz: agora é que a obra avança!
E fez-se algo mais:
- Em Junho de 1998 elaborei e entreguei à Junta uma proposta de “Regulamento de Acesso aos Lotes do Bairro Social do Cabeço”, proposta esta que a Junta submeteu à apreciação e votação da Assembleia de Freguesia na sessão de 30/6/98.
Desse Regulamento consta que a doação dos lotes cabe à Junta, sob proposta duma Comissão de Acompanhamento, logo ali eleita e assim composta: Presidente – O Pres. da Assembleia, Prof. José Manuel Domingues; o membro da Assembleia - Plácido Carriço; o Pároco local - Manuel Arlindo; a Assistente Social - Isabel Maria Mestre e o Tesoureiro da Junta - Manuel Luzio.
Coitados. Foram eleitos para acompanhar o quê, se nem um palmo de terra foi mexido para erguer os arruamentos? E as infra-estruturas básicas? Que é delas?
- Entretanto e apesar da vontade inicial de “doação” dos terrenos, a Junta fez aprovar em sessão da Assembleia de 25/9/98 uma tabela de preços para cada lote: 800$00/m2 para a área total do lote e 1.000$00/m2 para a respectiva área de implantação.
- Em reunião de 5/6/2001 mais a Junta deliberou:
1. Destinar os lotes 1 a 9 a habitações de renda económica, para as famílias mais necessitadas;
1. Destinar os lotes 1 a 9 a habitações de renda económica, para as famílias mais necessitadas;
2. “Que o projecto das habitações sejam adaptados e que a sua construção seja da responsabilidade da Junta de Freguesia, podendo a mesma recorrer a projectos comparticipados”;
3. Manter os restantes lotes dentro dos parâmetros aprovados, com actualização dos preços “ com a mais-valia na percentagem de 25%, ficando a tabela como segue: Área do lote – 1.000$00m2; Área de implantação da construção – 1.250$00/m2; Total do custo da aquisição do lote = (Custo da Área do lote + custo da Área de implantação da construção).
E aqui têm a “obra” feita nesses dois mandatos da Junta!
Não falo do 3º mandato (2005/2009), porque sei que foi difícil a convivência com os novos césares do município. Aliás, as prioridades do actual executivo camarário esgotaram-se com o enxame de novas escolas (8) e a grande obra do regime: a Alameda da Cidade. E, valha a verdade, investiu-se no apoio às Associações como nunca antes aconteceu.
4. O que defendemos
4. O que defendemos
- Na sessão de 29 de Abril de 2003, durante uma breve passagem pelas bancadas da Assembleia Municipal, questionei os Srs. Presidente da Câmara e da Junta de Bustos sobre o Bairro Económico do Cabeço. A resposta, brevíssima, do Eng.º Pereira foi que aguardava orçamento, dependendo da Câmara o ónus de fazer o saneamento e arruamentos. Como se o seu papel fosse esperar sentado por uma esmola dos cofres camarários…
Fiquei a saber que o Presidente da Junta de Bustos teve pouco peso nas decisões do Dr. Acílio Gala.
Na área da habitação, o Sr. Presidente da Câmara empenhou-se mas foi em aprovar e avançar com a sua proposta da Urbanização Dr. Carlos Pereira, no Passadouro - Troviscal, sua terra, obra de louvar, mas que revela bem a disparidade e injustiça de critérios no tratamento que as freguesias do concelho têm merecido do Dr. Acílio Gala.
Aí, sim, a Câmara comprou 35.000m2 de terreno por 125.000€, destinados a urbanização e parque de laser!
Aí, sim, a Câmara fez num ano o que não fez em Bustos em 14 anos!
Mais:
- Na sessão de 28/7/2004 da mesma Assembleia Municipal e a propósito desta urbanização troviscalense, o membro eleito por Bustos, Dr. Manuel Nunes, questionava o Dr. Acílio Gala sobre as razões que levaram ao esquecimento do Bairro Económico do Cabeço.
A resposta foi que “a situação não está parada e possivelmente a Câmara tem de pegar nela”.
Possivelmente? Em política, "possivelmente" significa nunca!
Em 2005 a Câmara continuou a investir na construção das infra-estruturas da Urbanização do Troviscal, as quais concluiu e onde hoje existe um bairro que nada tem de económico.
- Mas nem um cêntimo gastou no Bairro Económico do Cabeço!
Entretanto e já no actual mandato PSD, os eleitos por Bustos (Gladys del Carmen, Duarte Novo e eu próprio, embora em regime de substituição) insistiram na construção do bairro.
Em vão!
Estou curioso por conhecer os programas eleitorais dos candidatos de Bustos para o mandato de 2009 a 2014.
Terão atirado definitivamente ao lixo o malfadado Bairro Económico do Cabeço?
Terão atirado definitivamente ao lixo o malfadado Bairro Económico do Cabeço?
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Oscar Santos
[Elaborado em 13/2/2004. Revisto em 12/3/2009. Novamente revisto e actualizado em 20/9/2009]